A Gazeta de Rio Preto publicou entrevista com Augusto de Franco, que esteve ontem na cidade a convite do Rotary Alvorada para conversar sobre temas do nosso cotidiano, como ‘democracia e ciência das redes, mas sob um ponto de vista diferente do que estamos acostumados. Vale a pena!
Por Frederico Tebar.

1. Você é um estudioso das redes sociais. Como definiria esse espaço nos dias de hoje?
É preciso ver, antes de qualquer coisa, que redes sociais são pessoas interagindo, não ferramentas tecnológicas, plataformas ou sites (como o Facebook e o Twitter). Chamamos de redes a padrões de interação mais distribuídos do que centralizados.

2. Como se forma uma rede social?
Redes sociais mais distribuídas do que centralizadas podem ser feitas com qualquer mídia. Podem ser articuladas com o Facebook, com telefone, com encontros presenciais, com cartas escritas a mão e postadas no Correio e, inclusive, com sinais de fumaça (como faziam os Apaches). Não é a ferramenta, não é a tecnologia e sim a forma como nos organizamos.

3. Qual o maior erro das pessoas ao se manifestarem nas mídias sociais?
Em geral o maior erro das pessoas que usam as mídias sociais é confundir mídias interativas com mídias broadcasting (transmissão um-para-muitos, como a TV e o rádio, ou mesmo a revista e o jornal). E então, em vez de aproveitarem as oportunidades da interação pessoa-com-pessoa, essas pessoas querem usar as mídias sociais para fazer propaganda no estilo tradicional, seja comercia, seja política.

4. Mídias sociais são consideradas um espaço sem lei. Você concorda?
As leis que já existem valem para as sociedades (e as sociedades são redes sociais). Já as mídias sociais são regulamentadas, em grande parte, pela interação entre seus usuários e não por uma instância normativa superior (como o Estado).

5. A morte do cantor Cristiano Araújo ganhou dimensões gigantes a partir das mídias sociais. Como enxerga esse acontecimento?
Em sociedades altamente conectadas, como as que já vivemos, as pessoas podem emitir suas opiniões. No caso de uma catástrofe ou de uma tragédia que cause uma comoção, as pessoas podem manifestar sua tristeza ou sua solidariedade (o que antes das mídias sociais interativas não podiam fazer). A dinâmica então é semelhante à da contaminação viral e isso cresce exponencialmente

A imagem que não me sai da cabeça foi a das pessoas confraternizando no dia 20 de junho de 2013, na Avenida Paulista, sentadas no chão como se estivessem numa festa.

6. Qual sua opinião sobre os movimentos sociais. Estamos no caminho certo?
Estudo as redes sociais, não o que tradicionalmente se chama de movimento social (organizado, hierárquico). Por exemplo, o que aconteceu no Brasil em junho de 2013 foi um movimento social stricto sensu: algo espontâneo, sem comando, chefe, sem centralização. Esses, aliás, são os verdadeiros movimentos sociais, não - para citar um exemplo - o MST (que é uma organização política hierárquica e autocrática travestida de movimento social).

7. Sobre o Movimento Vem pra Rua, qual a sua opinião? O que mudaria nele para fortalecê-lo?
Não se trata bem de um movimento e sim de um grupo que convoca manifestações pelo Facebook e outras mídias. Minha opinião é que todos têm o direito de convocar, mas o que acontece não tem a ver com a vontade dos que convocam.

8. Como estudioso da democracia, qual acredita ser o principal erro do cidadão brasileiro?
No Brasil se confunde democracia com eleição. E então não se vê que a eletividade é apenas um dos critérios democráticos. Mas a legitimidade da democracia é uma combinação de vários requisitos: além da eletividade, a liberdade, a publicidade (ou transparência), a rotatividade (ou alternância), a legalidade e a institucionalidade.

9. Isso acontece?
No Brasil atual vários desses requisitos estão sendo violados ou descumpridos. Por exemplo, a legalidade está sendo atropelada (na medida em que o governo pratica o banditismo de Estado) e a institucionalidade está sendo degenerada (com o aparelhamento e a corrupção generalizada nas instituições).

10. Circulando de norte a sul do país presenciou todos os cenários. Qual imagem não sai da sua cabeça?

A imagem que não me sai da cabeça foi a das pessoas confraternizando no dia 20 de junho de 2013, na Avenida Paulista, sentadas no chão como se estivessem numa festa. Outra imagem também muito significativa foi a das pessoas em Brasília, ainda em junho de 2013, na laje superior do Congresso Nacional, lançando suas sombras sobre a estrutura.

Quem é Augusto de Franco?
Escritor, palestrante e consultor. É o criador e um dos netweavers da Escola-de-Redes - uma rede de pessoas dedicadas à investigação sobre redes sociais e à criação e transferência de tecnologias de netweaving. É autor de várias dezenas de livros e textos sobre desenvolvimento local, capital social, democracia e redes sociais. Entre eles: A terceira invenção da Democracia; Democracia: um Programa autodidático  de aprendizagem; Desenvolvimento, capital social e Democracia.