Coleta e tratamento de esgoto impactam no desenvolvimento humano
“O Instituto Trata Brasil é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), com o objetivo de coordenar uma ampla mobilização nacional para que o país possa atingir a universalização do acesso à coleta e ao tratamento de esgoto.” Entrevistamos o seu presidente executivo, Edison Carlos, para saber sobre as perspectivas de mudança e avanços nessa área, já que atualmente o Brasil ocupa o 9º lugar no ranking mundial “da vergonha” com 13 milhões de habitantes sem acesso a banheiro. A falta de saneamento básico traz outras consequências que impactam também no bem-estar, na qualidade de vida dos cidadãos e no progresso do país.
1. Desde a criação do Instituto Trata Brasil (ITB) houve avanços na gestão do saneamento no Brasil?
Sim. Está havendo um avanço no saneamento básico, mas infelizmente numa velocidade bem abaixo do necessário, por exemplo, para que toda a população brasileira possa contar com água tratada, coleta e tratamento de esgotos até 2033, que é a meta do governo federal. Nos últimos 4 anos a média de investimentos em saneamento tem ficado próximo aos R$ 8 bilhões por ano quando deveria ser de R$ 15 bilhões no mínimo. Outro problema é que as regiões que dispõem de menores índices de saneamento, que são o Norte e Nordeste, avançam ainda mais lentamente, sendo que necessitariam avançar muito mais rápido, pois sua população vem sofrendo de muitas doenças transmitidas pela água poluída.
2. Atualmente quais as ações realizadas pelo ITB para atingir os seus objetivos?
O Trata Brasil tem duas linhas de trabalho: a primeira é a de geração de informação para mostrar à população que a falta de água tratada, coleta e tratamento de esgotos têm um grande impacto à sua vida; muito maior do que se imagina. É o cidadão que paga a conta quando a cidade ou o seu bairro não possui esses serviços que deveriam ser básicos. Acabamos sofrendo com doenças, as crianças faltam mais à escola, adultos faltam ao trabalho, praias ficam poluídas afastando os turistas, entre outros problemas. A outra linha de atuação é a de cobrança por avanços nas 100 maiores cidades do país. Acompanhamos todos os anos o que avançou ou não nesses grandes municípios e damos visibilidade a isso através da imprensa. Acompanhamos também a velocidade de avanços de 138 grandes obras de esgoto financiadas pelo PAC em cidades acima de 500 mil habitantes. Infelizmente, 65% dessas obras não estão cumprindo os cronogramas originais e muitas delas permanecem paralisadas após quase 5 anos da assinatura dos contratos. Temos ainda projetos em comunidades ajudando na conscientização e tentando que os próprios moradores solucionem os problemas de saneamento básico da região.
3. Qual é a região mais prejudicada pela falta de coleta e tratamento de esgoto no Brasil?
Se falarmos de região, o Norte sem dúvida é a mais prejudicada; cidades de Rondônia, Pará, Amapá e Acre têm números baixíssimos de coleta e tratamento de esgoto. Nessa região, menos de 60% da população possui água tratada e menos de 10% conta com coleta de esgotos. Isso mostra como está longe o alcance ao saneamento básico na região Norte.
4. Por que em algumas regiões os índices de coleta e tratamento de esgoto são melhores? É por causa da conscientização da população ou do comprometimento do poder público?
Os dois, pois nem as próprias capitais escapam deste problema. Se analisarmos o último ranking divulgado pelo SNIS de 2010, capitais como Natal, Cuiabá, Maceió, Rio Branco e Porto Velho estão bem abaixo do esperado. O comprometimento do poder público com o saneamento básico está aumentando, mas isso não é generalizado, infelizmente. Apenas em algumas regiões nós temos índices de sucesso, como no Sudeste e parte do Sul e Centro-Oeste. Cidades, por exemplo, como Santos, Uberlândia, Franca, Niterói, Maringá, entre outras são bons exemplos de cidades onde a coleta e o tratamento de esgotos caminham para a universalização.
5. Que peso o saneamento tem na definição do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano)? Como seria o ideal?
Impacto importante, pois com um saneamento básico levado a sério, os casos de doenças diminuem; com isso as prefeituras deixam de gastar com internações e podem investir em outros setores mais precários. Menos doenças significam mais expectativa de vida, menos gastos, o que melhora a renda, além de menos ausências de crianças à escola.
6. O que falta para melhorar a coleta e o saneamento de esgoto no Brasil?
A vida pública dura 4 anos, talvez seja pouco tempo para realizar trabalhos a longo prazo, então muitos políticos preferem obras que dão visibilidade pública, como construção de viaduto, revitalização de praças, pavimentação de ruas e avenidas, entre outros. Não digo que nada disso não seja preciso, mas saneamento básico é uma necessidade básica para qualquer comunidade e qualquer cidadão. Falta, portanto, uma maior consciência do cidadão para o problema e um maior comprometimento das autoridades. É necessário que o Governo Federal desburocratize o acesso aos recursos financeiros e que se atrele a entrega desses recursos às empresas que cumpram metas de melhoria, redução das perdas de água e energia. A mobilização do cidadão também por saneamento ainda é pequena no Brasil, mas acreditamos que aos poucos estamos atingindo. Precisamos mudar a lógica política de dar valor apenas para obras de visibilidade. Saneamento básico deve ser uma pauta comum de lideranças comunitárias, de vereadores, prefeitos, etc. O brasileiro precisa entender que a necessidade de uma coleta e o saneamento de esgoto são deveres da prefeitura de cada município.